"Tu olhas para uma pessoa, uma pessoa que sabes que não é uma pessoa qualquer, porque o teu olhar fixa-se nela, e quando ela olha para ti e sente o mesmo que tu, sentes que alguma coisa vai acontecer. Não sabes nada ainda, mas intuis com os teus sentidos, com o teu corpo e às vezes com o teu coração, que aquela pessoa pode ter qualquer coisa para te dar, que não sabes o que é, mas sabes que um dia vais descobrir e que esse dia pode ser nesse momento, e é então que tiras os dados do bolso e os atiras para cima da mesa. Quando nos interessamos por alguém nunca sabemos no que vai dar. Lançamos os dados como quem os deixa cair quase por acaso e muitas vezes não queremos saber quanto deram. Os dados caíram quando levantaste o copo e eu vi no chão seis e seis, vi-te apanhar os dados e a rir, ouvi a tua voz e quando começámos a conversar, percebi que os dados estavam certos. Gostamos de tudo um no outro; eu gosto da tua casa, da tua música, da tua forma desligada de olhar para o mundo, tardes inteiras a repetir em stereo os melhores sketches do Gato Fedorento, os passeios à beira mar de camisola de lã com capuz, as polaroids com legendas e a forma como te divertes com tudo o que te rodeia. E tu gostas da minha alegria de viver, do meu sarcasmo cirúrgico, de dizer sempre tudo o que penso, sinto e quero, mesmo quando não estás preparado para me ouvir. Eu gosto de te conhecer e de te perceber, porque és diferente dos outros homens e tu gostas que eu te entenda melhor do que todas as outras mulheres, E gostamos de estar um com o outro; à mesa, na cama, com amigos, sem amigos, com sono, sem sono, mas sempre perto quando estamos perto, mesmo que fiquemos longe quando nos afastamos. Tu foste e és tudo isto, e ainda mais agora, que somos amigos; entre nós não há pesos nem amarras e o silêncio não quer dizer ausência, apesar da ausência reinar nos nossos dias.
Só tenho pena de não ser dona do tempo, porque houve momentos, que se pudesse, teria vivido mais vezes ou mais devagar. E como escrever é a melhor forma de falar sem ser interrompido, digo-te agora e sem rodeios, fica comigo mais uma vez, vem rir do mundo e adormecer nos meus braços, abrir o teu coração e sonhar acordado, vem ter comigo hoje, porque eu quero lançar outra vez os dados e aposto que vai dar seis e seis outra vez, porque os dados nunca se enganam e a amizade é o amor sem preço e sem prazo de validade."
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 - Margarida Rebelo Pinto, "Seis e Seis"


4 comentários:

  1. Margarida de Rebelo Pinto é fantástica! E fizeste muito bem em transportar-nos um pouco do seu mundo, eu pelo menos acho que sim.
    «houve momentos, que se pudesse, teria vivido mais vezes ou mais devagar. E como escrever é a melhor forma de falar sem ser interrompido, digo-te agora e sem rodeios, fica comigo mais uma vez,» - E o tempo não volta atrás por isso precisamos de deitar as paredes abaixo e saltar no momento para que não nos arrependamos de ter deixado o tempo se ir! Gostei imenso! :) E obrigado pelo carinho, doce *

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  2. oh, muito obrigada :), nunca se sabe se é amanha :p
    Adorei o teu post *

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  3. ohw és uma querida :) e escreves muito bem !

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  4. Obrigado Raquel...adoro akilo que escreves..
    fica bem :)

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«Sonhos não morrem, apenas adormecem na alma da gente!»

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